POLĂTICA - PARA NĂO SER IDIOTA
01/09/2010 -
COLUNA DO CANALHA
OS IDIOTAS
Neste segundo semestre, começa a temporada de uma das mais ĂĄrduas batalhas por um emprego, superando de longe a relação candidato/vaga do mais disputado vestibular ou de qualquer concurso pĂșblico. Em alguns casos, sĂŁo 2.800 candidatos por vaga, que se submetem a uma maratona de provas e entrevistas. Se nĂŁo for fluente em inglĂȘs, Ă© melhor nem tentar: esse Ă© um dos requisitos mĂnimos para ser admitido como trainee nas melhores empresas brasileiras.
Uma das principais especialistas em recrutamento de jovens no mercado de trabalho, a psicĂłloga Sofia Esteves informa que tĂŁo importante quanto ter um diploma de uma boa escola Ă© demonstrar sĂłlida capacidade de argumentação, criatividade, anĂĄlise crĂtica e conhecimentos gerais. Precisa ter claro um projeto de futuro (o que implica autoconhecimento). Durante toda a bateria de testes, vai precisar mostrar que quer muito ser escolhido e que estĂĄ disposto a se submeter a metas rĂgidas.
Essa crescente cultura meritocrĂĄtica nas empresas ajuda a explicar a aversĂŁo dos jovens Ă vida polĂtica, que, neste ano, ganhou como Ăcone o comediante Tiririca, autor do slogan mais polĂȘmico destas eleiçÔes ("Pior do que estĂĄ nĂŁo fica").
Um dos problemas do paĂs (que se acentua cada vez mais) Ă© a crescente rejeição de jovens talentosos a entrar na vida pĂșblica ou mesmo a acompanhĂĄ-la.
Isso Ă© o que se pode chamar de idiotice -pelo menos no sentido que os antigos gregos emprestavam ao termo.
Num livro lançado neste mĂȘs, os filĂłsofos MĂĄrio SĂ©rgio Cortella e Renato Janine Ribeiro contam que a palavra "idiota" vem do grego "idiĂłtes", expressĂŁo usada para designar quem nĂŁo participava da vida polĂtica, considerada uma atividade suprema e nobre.
A "idiotice", nesse sentido grego, virou uma atitude disseminada em boa parte da elite brasileira, especialmente entre os jovens, mas nĂŁo sem motivo: afinal, sĂŁo tantas as notĂcias de corrupção e fisiologia, um pragmatismo que beira a imoralidade. E, aĂ, nĂŁo se diferenciam os partidos: Lula estĂĄ no mesmo palanque de Collor, Serra estĂĄ no mesmo palanque de Orestes QuĂ©rcia.
Bandalheiras, desvios e desperdĂcios provocam tĂŁo pouco escĂąndalo porque as pessoas nĂŁo prestam atenção ao noticiĂĄrio e, se prestam, acham que polĂtica Ă© isso mesmo.
Tudo acaba se misturando e justificando as imagens de Tiririca, Ronaldo Esper, Agnaldo TimĂłteo, Marcelinho Carioca, Maguila.
Ă um ambiente muito distinto do das empresas que tentam fisgar a atenção dos melhores trabalhadores. Elas tĂȘm de se apresentar Ă©ticas, transparentes, socialmente responsĂĄveis, como lugares onde se possa aprender e se desenvolver. Essa Ă© a receita para atrair e manter os talentos que, segundo as pesquisas, priorizam nĂŁo o salĂĄrio, mas o aprendizado e a qualidade de vida.
Ă por isso que sĂŁo empresas mais inovadoras e, por serem mais inovadoras, conseguem melhores e mais sustentĂĄveis lucros.
Quando Ă© talentoso e empreendedor, o jovem prefere abrir sua prĂłpria empresa e correr mais riscos.
Os chefes de recursos humanos sĂŁo cada vez mais criativos. JĂĄ hĂĄ empresas que oferecem, durante o perĂodo de trabalho, sessĂ”es de ioga ou massagem, alĂ©m de academias de ginĂĄstica e locais para tirar uma soneca depois do almoço. Os horĂĄrios tambĂ©m vĂŁo ficando flexĂveis.
Essas empresas bancam a faculdade e cursos de especialização ou quaisquer cursos, mesmo que nada tenham a ver com o trabalho. Muitos chefes acreditam que a simples vontade de aprender -de culinåria a alpinismo- é algo bom para a produtividade do empregado.
Um dos atrativos da IBM (a campeĂŁ de registro de patentes) Ă© postar na sua intranet todas as oportunidades de emprego que seus profissionais podem postular na empresa em qualquer lugar do planeta. Uma das agĂȘncias mais premiadas no Brasil, a DM9DDB oferece dois dias livres por mĂȘs para seus funcionĂĄrios exercerem alguma atividade comunitĂĄria, desde que, depois, a experiĂȘncia seja compartilhada com os colegas.
DaĂ se pode medir como um jovem se sente quando um Tiririca admite orgulhosamente que desconhece o papel de um deputado e que, apesar disso, com ele no Congresso, pior nĂŁo fica. Ă como se todos fĂŽssemos idiotas -e nĂŁo no sentido grego.
PS - No www.dimenstein.com.br, coloquei trechos do livro "PolĂtica Para NĂŁo Ser Idiota", de MĂĄrio SĂ©rgio Cortella e Renato Janine Ribeiro.
Gilberto Dimenstein - Fonte: Folha de S.Paulo - 29/08/10.Blog do HermĂno: http://www.herminio.com.br/
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