TEMPO, FRASES, ANĂNCIOS DE EMPREGO...
07/03/2007 -
PENSE!
NOME DA SEMANA: PARKINSON - Cyril Northcote Parkinson (1909-1993), jornalista inglĂȘs, formulou a lei bĂĄsica dos escritĂłrios de outrora: "Todo trabalho se expande atĂ© preencher o tempo disponĂvel". Atualmente, as empresas fazem o contrĂĄrio: aumentam o volume de trabalho, acreditando que ele sempre se encaixarĂĄ no tempo disponĂvel.
(Max Gehringer)
Fonte: Ăpoca - Nr. 460.
FRASES DO MILLĂR
"Humor? Caras de bom senso, bons pais de famĂlia, respeitadores de todos os princĂpios, obrigados por assaltante a tirar a roupa e ficar nus dentro do ĂŽnibus. Isso Ă© humor. Em qualquer paĂs, negro. Aqui, normal."
"Só conheço uma verdade: mentimos sem parar."
"Um recĂ©m-nascido Ă© a prova de que, apesar de tudo isso que vocĂȘs fazem com ela, a natureza ainda nĂŁo desistiu do ser humano."
"As liçÔes de economia entram por um bolso e saem pelo outro."
"VocĂȘs podem nĂŁo concordar, mas acho que o Lula fala quase tanta besteira quanto o Fernando Henrique. SĂł que este nĂŁo apenas fala, escreve-AS."
"O que é Cultura, senão a ampliação da nossa ignorùncia?"
Fonte: Veja - Edição 1.999.
MAX GEHRINGER - Colunista da Revista EXAME e VOCĂ S/A.
Vi um anĂșncio de emprego. A vaga era de gestor de atendimento interno, nome que agora se dĂĄ Ă seção de serviços gerais. E a empresa contratante exigia que os eventuais interessados possuĂssem sem contar a formação superior, liderança, criatividade, energia, ambição, conhecimentos de informĂĄtica, fluĂȘncia em inglĂȘs e nĂŁo bastasse tudo isso, ainda fossem hands on.
Para o felizardo que conseguisse convencer o entrevistador de que possuĂa mesmo essa variada gama de habilidades, o salĂĄrio era um assombro: 800 reais. Ou seja, um pitico. NĂŁo que esse fosse algum exemplo absolutamente fora da realidade. Pelo contrĂĄrio, ele Ă© quase o paradigma dos anĂșncios de emprego atuais. A abundĂąncia de candidatos estĂĄ permitindo que as empresas levantem, cada vez mais, a altura da barra que o postulante terĂĄ de saltar para ser admitido.
E muitos, de fato, saltam. E se empolgam. E aĂ vĂȘm as agruras da superqualificação, que Ă© uma espĂ©cie do lado avesso do efeito pitico...
Vamos supor que, apĂłs uma durĂssima competição com outros Candidatos tĂŁo bem preparados quanto ela, a Fabiana conseguisse ser admitida como gestora de atendimento interno... E um de seus primeiros clientes foi o seu Borges, gerente da contabilidade.
- Fabiana, eu quero trĂȘs cĂłpias deste relatĂłrio.
- In a hurry!
- SaĂșde.
- NĂŁo, isso quer dizer "bem rapidinho". Ă que eu tenho fluĂȘncia em inglĂȘs. AliĂĄs, desculpe perguntar, mas por que a empresa exige fluĂȘncia em inglĂȘs se aqui sĂł se fala portuguĂȘs?
- E eu sei lĂĄ? DĂĄ para vocĂȘ tirar logo as cĂłpias?
- O senhor nĂŁo prefere que eu digitalize o relatĂłrio? Porque eu tenho profundos conhecimentos de informĂĄtica.
- NĂŁo, nĂŁo .. CĂłpias normais mesmo.
- Certo. Mas eu nĂŁo poderia deixar de mencionar minha criatividade. Eu jĂĄ comecei a desenvolver um projeto pessoal visando eliminar 30% das cĂłpias que tiramos.
- Fabiana, desse jeito nĂŁo vai dar!
- E eu nĂŁo sei? Preciso urgentemente de uma auxiliar.
- Como assim?
- Ă que eu sou lĂder, e nĂŁo tenho ninguĂ©m para liderar. E considero isso um desperdĂcio do meu potencial energĂ©tico.
- Olha, neste momento, eu sĂł preciso das trĂȘs cĂł...
- Com certeza. Mas antes vamos discutir meu futuro...
- Futuro? Que futuro?
- Ă que eu sou ambiciosa. JĂĄ faz dois dias que eu estou aqui e ainda nĂŁo aconteceu nada.
- Fabiana, eu estou aqui hå 18 anos e também não me aconteceu nada!
- Sei. Mas o senhor Ă© hands on?
- HĂŁ?
- Hands on. MĂŁo na massa.
- Claro que sou!
- Então o senhor mesmo tira as cópias. E agora com licença que eu vou sair por aà explorando minhas potencialidades. Foi o que me prometeram quando eu fui contratada.
Então, o mercado de trabalho estå ficando dividido em duas facçÔes:
1 - Uma, cada vez maior, Ă© a dos que nĂŁo conseguem boas vagas porque nĂŁo tĂȘm as qualificaçÔes requeridas.
2 - E o outro grupo, pequeno, mas crescente, Ă© o dos que sĂŁo admitidos porque possuem todas as competĂȘncias exigidas nos anĂșncios, mas nĂŁo poderĂŁo usar nem metade delas, porque, no fundo, a função nĂŁo precisava delas.
Alguém ponderarå - com justa razão - que a empresa estå de olho no longo prazo: sendo portador de tantos talentos, o funcionårio poderå ir sendo preparado para assumir responsabilidades cada vez maiores.
Em uma empresa em que trabalhei, nĂłs caĂmos nessa armadilha. Admitimos um montĂŁo de gente superqualificada. E as conversas ficaram de tĂŁo alto nĂvel que um visitante desavisado que chegasse de repente confundiria nossa salinha do cafĂ© com o auditĂłrio da Fundação Alfred Nobel. Pessoas superqualificadas nĂŁo resolvem simples problemas!
Um dia um grupo de marketing e finanças foi visitar uma de nossas fĂĄbricas e no meio da estrada, a van da empresa pifou. Como isso foi antes do advento do milagre do celular, o jeito era confiar no especialista, o Cleto, motorista da van. E aĂ todos descobriram que o Cleto falava inglĂȘs, tinha noçÔes de informĂĄtica e possuĂa energia e criatividade. Sem mencionar que estava fazendo pĂłs-graduação. SĂł que nĂŁo sabia nem abrir o capĂŽ.
Duas horas depois, quando o pessoal ainda estava tentando destrinchar o manual do proprietĂĄrio, passou um sujeito de bicicleta. Para horror de todos, ele falava "nĂłis vai" e coisas do gĂȘnero. Mas, em 2 minutos, para espanto geral, botou a van para funcionar. Deram-lhe uns trocados, e ele foi embora feliz da vida. Aquele ciclista anĂŽnimo era o protĂłtipo do funcionĂĄrio para quem as empresas modernas torcem o nariz: O que Ă© capaz de resolver, mas nĂŁo de impressionar.
(colaboração: OB Cheiroso)
FRANKENSTEIN NA VOLTA ĂS AULAS
A nova Secretaria de Ensino Superior ainda nĂŁo disse a que veio, e os primeiros sinais que emitiu sobre si prĂłpria nĂŁo sĂŁo alentadores.
NA VOLTA às aulas, o ambiente universitårio terå de conviver com uma nova criatura, por ora ainda meio desapercebida numa névoa de confusão ou de programåtica cortina de fumaça: a Secretaria de Ensino Superior.
Gerada pelos decretos do primeiro dia do governo Serra que intervĂȘm na autonomia de gestĂŁo financeira, administrativa e tecnocientĂfica das universidades estaduais paulistas, a nova secretaria ainda nĂŁo disse a que veio, e os primeiros sinais que emitiu sobre si prĂłpria nĂŁo sĂŁo alentadores.
De inĂcio, a nova secretaria, estranhamente hĂbrida, pois sucedĂąnea da Secretaria de Turismo, reclamava para si a presidĂȘncia do Conselho de Reitores (Cruesp), o que nĂŁo chegou a vingar. Com o alerta geral, foi restituĂda a quem de direito -os reitores-, embora se mantendo o aumento do titular da secretaria recĂ©m-criada na composição do ĂłrgĂŁo. A sua presença, ao lado dos secretĂĄrios de Desenvolvimento e da Educação, continua a dar, na prĂĄtica, vantagem ao governo.
O "engano" do decreto que, entre outras coisas, depusera a reitora da USP do cargo sem aviso prévio foi só em parte reparado, e questÔes de fundo permanecem intocadas.
As universidades pĂșblicas paulistas, comprometidas com a pesquisa, alĂ©m do ensino e da extensĂŁo, foram incompreensivelmente apartadas da Secretaria de CiĂȘncia e Tecnologia, onde sempre estiveram bem situadas.
O efeito paradoxal da nova situação Ă© o predomĂnio de uma concepção divisionista entre pesquisa e ensino, como a que existe nas universidades privadas, que serĂŁo, aliĂĄs, de longe, o contingente maior da nova secretaria.
TambĂ©m foi englobada por ela, de modo a acentuar sua forma hĂbrida e arbitrĂĄria, o Memorial da AmĂ©rica Latina, que pouco tem a ver com ensino superior, mas, curiosamente, ficaram fora dela as Fatecs, mais afins ao rĂłtulo que engendra o novo ente. A Fapesp, por sua vez, decisiva para o incremento da pesquisa nas universidades, fica livre da companhia delas na doravante Secretaria do Desenvolvimento, da qual atĂ© os termos ciĂȘncia e tecnologia foram banidos.
Ante essa criatura mal ajambrada, que sĂł leva Ă hipertrofia da mĂĄquina estatal que o governador diz querer enxugar, vĂĄrias perguntas nĂŁo calam.
Por que a melhor pesquisa cientĂfica, tecnolĂłgica e em humanidades e a melhor educação superior pĂșblica do paĂs devem ser lançadas na vala comum da indĂșstria privada de diplomas, que ora o secretĂĄrio Pinotti pretende refundar sob a alcunha de "Sistema de Ensino Superior do Estado"?
Por que arrastar o setor de ponta da formação superior de professores e pesquisadores para o mesmo processo de mediocrização que gerou o desmanche da escola bĂĄsica, fundamental e mĂ©dia, processo de que os governantes sĂŁo artĂfices ou cĂșmplices, no Brasil e, muito vergonhosamente, no Estado de SĂŁo Paulo, conforme demonstram, com dados terrĂveis, reportagem de capa e caderno especial desta Folha, em 8/2, e, agora, em 6/3, na reprovação de todas as mais de 600 escolas estaduais da capital paulista no Ășltimo Enem?
O pacote de boas intençÔes do secretĂĄrio Aristodemo Pinotti e do secretĂĄrio-adjunto Eduardo Chaves Ă© flagrantemente extemporĂąneo. EstĂĄ claro que nĂŁo se vai resgatar pelo fim a calamidade começada cedo. Ademais, uma preocupação sĂ©ria com a efetiva melhora do ensino bĂĄsico, fundamental e mĂ©dio constituiria matĂ©ria desde sempre afeita Ă Secretaria da Educação. Querer transferir essa responsabilidade para as universidades estaduais nos parece manobra diversionista e demagĂłgica. Nossas licenciaturas, das melhores do paĂs, continuam a formar excelentes professores, que sĂł nĂŁo sĂŁo aproveitados como deviam porque o governo lhes falta com infra-estrutura, vagas, salĂĄrios e carreiras decentes.
Se governos anteriores do Estado mais rico da Federação foram incapazes ou negligentes em priorizar polĂticas e recursos para salvar uma educação falida, por que criar mais essa secretaria, com se sabe lĂĄ quantos novos postos, que, afora a acomodação de aliados, maldisfarçada num baĂș de idĂ©ias anacrĂŽnicas, nĂŁo parece servir para nenhuma boa causa?
A nĂŁo ser que, ao dispersar gastos e fragmentar polĂticas, a secretaria frankensteiniana seja mais uma cortina de fumaça ante os grandes dilemas da educação brasileira, dos quais em geral todos os governos federais, estaduais e municipais tĂȘm irresponsavelmente se furtado, entre subterfĂșgios e parolagens.
ALCIR PĂCORA, 52, crĂtico literĂĄrio, Ă© diretor do IEL-Unicamp (Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas).
FRANCISCO FOOT HARDMAN, 54, Ă© professor titular de teoria e histĂłria literĂĄria e coordenador de Pesquisa do IEL-Unicamp. Foi editorialista da Folha.
Fonte: Folha de S.Paulo - 07/03/07.