A CIĂNCIA E OS CIENTISTAS
15/03/2008 -
MARILENE CAROLINA
MUSEU NACIONAL DE CIĂNCIA DE LONDRES
English:
http://www.bbc.co.uk/wiltshire/content/articles/2008/03/11/science_museum_library_feature.shtml
http://www.sciencemuseum.org.uk/visitmuseum.aspx
Reino Unido - FuncionĂĄrio do Museu Nacional de CiĂȘncia exibe uma cĂłpia rara do livro Teoria da Relatividade Especial e Geral, de Albert Einstein, em Swindon. As novas locaçÔes do museu, que tem sede em Londres, abriram para o pĂșblico apĂłs importantes trabalhos de Newton, Einstein, Darwin e Flamel terem sido transferidos para o local.
Fonte: Terra - 11/03/08.
A GUERRA DOS ALFABETIZADORES
"Vós, investigadores, não deveis confiar em autores que, apenas pelo emprego da imaginação, se fazem intérpretes entre a natureza e o homem, mas somente naqueles que exercitaram seu intelecto com os resultados de experimentos." Leonardo da Vinci.
Antes mesmo de Francis Bacon, Da Vinci jĂĄ mostrava o caminho da ciĂȘncia experimental, cujos avanços mudaram a face da Terra. Alguns ramos da ciĂȘncia embarcam em naves espaciais. Mas, entre nĂłs, hĂĄ educadores que, nessa matĂ©ria, continuam refestelados em seus uivantes carros de boi. As discussĂ”es sobre como alfabetizar uma criança ainda nĂŁo seguiram os conselhos de Da Vinci: se hĂĄ dĂșvidas, Ă© preciso buscar os "resultados de experimentos". Os vĂŽos da imaginação sĂł cobrem a decolagem do processo cientĂfico. A aterrissagem Ă© no solo do mundo real.
Circulam pelo menos quatro escolas de pensamento. HĂĄ uma que afirma ser a leitura um processo global. Aprende-se a ler frases inteiras, blocos de palavras. Ao lidar com um assunto palpitante, tudo dĂĄ certo. Esse Ă© o mĂ©todo exaltado pelos gurus e adotado quase universalmente. Outra escola afirma que o melhor Ă© metodicamente aprender sons e letras. Ă o mĂ©todo fĂŽnico, neto do velho bĂȘ-ĂĄ-bĂĄ. Uma terceira seita fica entre as duas anteriores. Adota o processo fĂŽnico, mas acha necessĂĄrio contar uma histĂłria interessante, em paralelo Ă tarefa mecĂąnica de aprender a associar sons e garranchos no papel. Por Ășltimo, hĂĄ um grupo agnĂłstico, que afirma que, nĂŁo importa o mĂ©todo, tudo depende do professor. Cada grupo cita seu guru favorito, e a discussĂŁo patina.
Como a capacidade de ler e entender Ă© algo eminentemente mensurĂĄvel, estamos falando de nĂșmeros. Por sorte, hĂĄ nĂșmeros em abundĂąncia. Isso porque, como os Estados Unidos e a Inglaterra passaram por dilema semelhante, foi criado um Literacy Panel, encarregado de juntar todas as pesquisas sĂ©rias feitas sobre o tema (veja-se Diane McGuinness, O Ensino da Leitura, editora Artmed). Apareceram cerca de 100 000 artigos cientĂficos. Passando o pente-fino, sobreviveram menos de quarenta. Pelas mesmas razĂ”es que nĂŁo Ă© necessĂĄrio ser engenheiro automobilĂstico para ver quem chegou em primeiro numa corrida, podemos medir qual mĂ©todo alfabetiza melhor sem entender suas teorias.
Os resultados sĂŁo bastante claros e se aplicam ao portuguĂȘs â por ser tambĂ©m uma lĂngua fonĂ©tica. Nem uma sĂł pesquisa confiĂĄvel mostrou vantagens para o mĂ©todo global. A disputa foi entre variantes do mĂ©todo fĂŽnico. A combinação do fĂŽnico com uma contextualização ou enredo nĂŁo mostrou bons resultados. Ao que parece, a historinha que acompanha o aprendizado de letras e sons desvia a atenção e consome tempo dos alunos. Ă melhor primeiro aprender a ler bem e depois dedicar-se a entender o que estĂĄ escrito. Observou-se tambĂ©m que, quanto mais fraco o aluno, mais o mĂ©todo fĂŽnico traz vantagens. Tais resultados puseram uma pĂĄ de cal na controvĂ©rsia. Todos os paĂses de Primeiro Mundo que haviam abandonado os mĂ©todos fĂŽnicos voltaram a adotĂĄ-los. Faz pouco, o ministro francĂȘs Gilles de Robien proibiu o global.
As pesquisas mostram vantagens sistemåticas para o fÎnico. Portanto, a hipótese dos agnósticos é negada. De fato, se o método fosse irrelevante, tais diferenças não existiriam. Mas os agnósticos podem ter alguma razão quando se comparam professores que não conhecem bem nem um método nem outro. Nesse caso, as comparaçÔes não mostram nada.
Em ciĂȘncia nĂŁo hĂĄ conclusĂ”es definitivas ou finais. Mas, atĂ© que se refutem as conclusĂ”es do Literacy Panel, o que sabemos hoje nos obriga a aceitar a superioridade do mĂ©todo fĂŽnico. A sociedade brasileira tem o direito de fazer duas exigĂȘncias aos que recebem salĂĄrio (pago pelos contribuintes) para cuidar de alfabetização. Que superem suas cruzadas ideolĂłgicas e se ponham de acordo. Que para isso se valham dos princĂpios da ciĂȘncia empĂrico-dedutiva, que, desde Bacon, todos os cientistas aceitam (ou seja, o que valida uma hipĂłtese sĂŁo experimentos, nĂŁo os gritos de seus defensores).
Claudio de Moura Castro é economista - Fonte: Veja - Edição 2051.
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