A PREOCUPAĂĂO COM A LINGUAGEM JURĂDICA
03/07/2007 -
FAZENDO DIREITO
A JUSTIĂA Ă CEGA!
A justiça é cega.
Veja aonde nĂłs chegamos: no Brasil, ela Ă© cega mesmo...
Confira a charge!
(Colaboração: A.M.B.)
"NĂŁo arredarei pĂ© da presidĂȘncia!"
Renan Calheiros, InsensĂvel aos apelos dos colegas para que se afaste do cargo.
Fonte: Veja - Edição 2016.
"Obrigado pelos elogios quanto a palestra de encerramento do final do semestre. Foi uma honra ser convocado para expor o tema. Fico feliz e estou à disposição para os próximos eventos, se necessårio. A minha responsabilidade só aumenta com a credibilidade da instituição e dos alunos. Abraços".
Leandro EustĂĄquio -Prof. curso Direito Faculdade Novos Horizontes
FM: Parabéns mais uma vez pela palestra e boas férias, professor.
"Outro dia houve um parecer aqui que era assim: embargo de declaração em desembargo de declaração em agravo nominal em agravo de instrumento num recurso extraordinårio".
ClĂĄudio Fonteles, ex-procurador da RepĂșblica, mostrando como Ă© rico o leque de recursos protelatĂłrios no JudiciĂĄrio brasileiro.
Fonte: Ăpoca - NĂșmero 477.
A PREOCUPAĂĂO COM A LINGUAGEM JURĂDICA
Uma das preocupaçÔes de alguns profissionais da ĂĄrea jurĂdica tem sido a questĂŁo da linguagem e essa nĂŁo Ă© uma preocupação recente.
HĂĄ aproximadamente trĂȘs anos, iniciamos uma pesquisa acerca desse assunto. Temos, entĂŁo, procurado manter contato com juristas que redigiram textos e artigos que tratam da linguagem jurĂdica. Nessa caminhada, temos analisado uma sĂ©rie de peças processuais (petiçÔes iniciais, contestaçÔes, sentenças, memoriais, acĂłrdĂŁos, entre outras) e o que mais nos tĂȘm chamado a atenção Ă© a utilização de uma linguagem excessivamente rebuscada, repleta de jargĂ”es e de bordĂ”es que nem todos entendem.
Sabe-se que, comunicar-se bem Ă©, entre outras, uma das formas de uma instituição exercer sua responsabilidade social, e, para isso, Ă© necessĂĄrio que haja eficiĂȘncia no processo comunicacional, ou seja, o conteĂșdo da mensagem transmitida pelo emissor precisa chegar com sucesso ao receptor, portanto, sem ruĂdos. Um dos ruĂdos que mais atrapalham a comunicação jurĂdica sĂŁo os vocĂĄbulos extremamente tĂ©cnicos e rebuscados, bem como, o abuso de latinismos, muitas vezes, escritos de maneira incorreta. Ainda sobre isso, convĂ©m relembrarmos o que dizem os Artigos 156 e 157 do CPC: âEm todos os atos do processo Ă© obrigatĂłrio o uso do vernĂĄculoâ...âSĂł poderĂĄ ser junto aos autos documento redigido em lĂngua estrangeira, quando acompanhado de versĂŁo em vernĂĄculo, firmada por tradutor juramentadoâ.
Lemos um artigo sobre isso no qual o autor dizia o seguinte: âĂ o latim que mais tenta os profissionais do Direito a mostrar conhecimento e a experimentar requintes estilĂsticos, com resultados Ă s vezes grotescosâ.
Seguindo essa mesma linha de pensamento, outro articulista comenta que: âAinda que saibamos o quanto Ă© difĂcil atingir o ideal de redigir peças judiciais em linguagem acessĂvel Ă s pessoas comuns, pois o uso da tĂ©cnica legitima o emprego de vocĂĄbulos e expressĂ”es cujo sentido escapa Ă maioria dos destinatĂĄrios da jurisdição, que Ă© o povo, essa deve ser uma meta sempre perseguida. Mas, nĂŁo hĂĄ como negar a existĂȘncia de cultores da linguagem cifrada, dos adeptos do preciosismo e que muitas vezes exibem um verniz erudito que nĂŁo resiste a maiores aprofundamentos, seja em conteĂșdo ou formaâ.
Assim, temos encontrado, em nossas anĂĄlises, certas expressĂ”es, comuns nos autos, que poderiam ser facilmente substituĂdas por outras, muito mais claras e objetivas como por exemplo: âFulcroâ por: âFundamentoâ; "PretĂłrio Excelso", "Excelso SodalĂcio", ou "EgrĂ©gio PretĂłrio Supremo", por: "Supremo Tribunal Federal"; "Peça exordial", "peça vestibular", "peça preambular" por: "petição inicial"; "Vistor" ou "expert" por: "perito"; "CĂŽnjuge sobrevivente" ou "consorte supĂ©rstite" por: "viĂșvo"; "Com tal proceder, tisnou vĂĄrias regras insculpidas no caderno repressor" por: âCom tal proceder, violou vĂĄrios artigos do CĂłdigo Penalâ.
NĂŁo estamos, com isso, fazendo apologia da vulgaridade ou da banalidade da linguagem jurĂdica, pois compreendemos que, em alguns momentos, os termos tĂ©cnicos nĂŁo podem ser dispensados, afinal, versamos sobre uma ciĂȘncia cujas palavras devem expressar conceitos precisos e definidos.
O que temos nos questionado Ă©, como, num mundo informatizado, imagĂ©tico, rĂĄpido como este em que estamos vivendo, pode perdurar uma linguagem jurĂdica que poucos entendem? Muito temos lido sobre o acĂșmulo de processos existentes e o volume que muitos deles tĂȘm. Ora, se podemos expressar uma idĂ©ia com duas ou com cinco palavras, por que nĂŁo expressamos com duas?
O juiz Wagner Guerreiro, de UberlĂąndia, Minas Gerais, defende a seguinte idĂ©ia: âPĂŽr no papel sĂł o necessĂĄrio Ă© um dos caminhos para se acabar com as pilhas de processos que estĂŁo na sala de esperaâ.
Diante disso, convĂ©m salientar que, escrever muito nĂŁo significa escrever bem. A prolixidade Ă© um defeito e nĂŁo uma qualidade. Ser prolixo no mundo atual Ă© estar desatualizado, Ă© retroceder. Uma das nossas prioridades no ensino superior, especificamente, no curso de Direito, tem sido fazer com que nossos alunos sejam capazes de escrever textos claros e objetivos, pois a objetividade, para nĂłs, Ă© uma das principais caracterĂsticas da comunicação eficiente, tanto oral, como escrita. Uma grande histĂłria nĂŁo precisa ser uma histĂłria grande.
Recebemos, recentemente, um e-mail do ministro Ruy Rosado Aguiar, do STJ, em que ele discorre o seguinte: âA simplificação da linguagem nĂŁo altera o seu conteĂșdoâ, e mais: âA compreensĂŁo deve ser buscada a todo o momentoâ. Diz ainda que: âA sentença pode e deve ser divulgada sem o exagero de termos desconhecidos pelas partes envolvidasâ.
Como dissemos acima, a preocupação com a linguagem jurĂdica nĂŁo Ă© tema recente. No FĂłrum de Debates sobre a Justiça Federal, promovido pelo Conselho dessa Justiça, em 1994, houve um consenso sobre a importĂąncia da utilização da linguagem eficaz. Foi recomendado aos juĂzes que utilizassem, nos atos judiciais, uma linguagem acessĂvel aos jurisdicionados.
Segundo o juiz, NovĂ©ly Vilanova, diretor do Foro da Seção JudiciĂĄria do Distrito Federal: âUma linguagem muito rebuscada prejudica o destinatĂĄrioâ. Para ele, âa prestação de contas Ă sociedade se dĂĄ por meio de sentenças e acĂłrdĂŁos que contĂȘm as razĂ”es pelas quais o juiz chega a uma solução e isto precisa ser reconhecido e compreendido por aquelas pessoas que vĂŁo, de algum modo, sofrer os efeitos da decisĂŁoâ.
Sabemos que, o mundo do Direito Ă©, por natureza, conservador, mas sempre hĂĄ tempo para mudanças, desde que sejam compreendidas como necessĂĄrias e Ășteis.
Por Ășltimo, esclarecemos que nosso objetivo Ă© propor um exame crĂtico acerca dessa fundamental âferramentaâ de trabalho do profissional da ĂĄrea jurĂdica que Ă© a linguagem. Estejamos refletindo sobre isso.
ProfÂȘ HĂ©lide Maria dos Santos Campos Ă© graduada em Letras, especializada em LĂngua Portuguesa, mestra em comunicação, doutoranda em Filologia e autora do livro Catedral EletrĂŽnica. Ă professora de Linguagem JurĂdica no curso de Direito e LingĂŒĂstica no curso de Letras, ambos na UNIP â Sorocaba.