A VIDA CONTINUA...
23/10/2006 -
PENSE!
O BRASIL CONTINUA
Votos pĂłs-eleitorais: que se minta e roube menos, que impere o estado de direito, que se desarmem os espĂritos.
Bem, assim sĂŁo as coisas. Agora devemos desarmar a ĂĄrvore, PĂŽr a decoração de volta nas caixas de papelĂŁo â Algumas quebraram â e levĂĄ-las para o sĂłtĂŁo. W.H. Auden, OratĂłrio de Natal.
Bem, assim sĂŁo as coisas. Tal qual no poema do inglĂȘs Auden, que celebra o fim do Natal, cumprimos mais uma etapa. A interminĂĄvel temporada eleitoral terminou. Agora Ă© recolher as faixas e os cartazes (felizmente menos numerosos que de outras vezes), ver mais cedo a novela, deixar de comer os dedos uns dos outros, tentar relaxar. O horĂĄrio polĂtico, tĂŁo trapaceiro no Ă©pico desfile de obras quanto no lirismo rastaqĂŒera das crianças sorridentes, estourando de tanta confiança no futuro, ficou para trĂĄs. Ficaram para trĂĄs os debates â ai, os debates! Aquelas vozes que jĂĄ nĂŁo se agĂŒenta mais ouvir, as respostas que nĂŁo respondem, as estocadas ensaiadas, os nĂșmeros que sufocam como um travesseiro na cara... Fixemo-nos no que esta campanha trouxe de bom â ela desmoralizou os debates. Nunca mais alguĂ©m em seu juĂzo dirĂĄ: "O que estĂĄ faltando nesta campanha Ă© debate".
Façamos votos de que, com as faixas e os cartazes â e os bonĂ©s, e as camisetas, e os palanques nos quais gente com manchas de suor na camisa capricha no truque simplĂłrio de ritmar a voz como senha para desencadear os aplausos, e os cretinos em volta, como macaquinhos amestrados, obedecem e aplaudem â, tambĂ©m as altas doses de mentira e de meias verdades sejam recolhidas ao sĂłtĂŁo, atĂ© a prĂłxima temporada. NĂŁo façamos ilusĂŁo: a mentira e as meias verdades nĂŁo serĂŁo eliminadas. Elas continuarĂŁo nossas companheiras de viagem, mesmo porque muitas vezes provocadas pelo fato de que nĂłs, o eleitorado, nĂŁo suportarĂamos a verdade. (Como disse um governante europeu: "Todos nĂłs sabemos o que devemos fazer. O que nĂŁo sabemos Ă© como ganhar as eleiçÔes depois".) Mas podemos desejar mentiras e meias verdades melhores. Um pouco menos deslavadas, menos cĂnicas.
JĂĄ tivemos campanhas lamentĂĄveis. Quase todas sĂŁo um atentado Ă inteligĂȘncia e ao bom gosto. Desta vez, porĂ©m, numa conjunção astral de rara infelicidade, tĂnhamos um candidato Ă©brio de soberba, prisioneiro do delĂrio de ter-se como o Predestinado, o Messias, contra o mestre-escola que aos domingos faz bico como sacristĂŁo. Ai!!! Dada a diferença nas preferĂȘncias em favor de um sobre o outro nas pesquisas, prenunciava-se uma campanha morna. Mas â curiosa campanha, esta â a certa altura o caldo desandou, e a intolerĂąncia contaminou vastas fatias da população, dividiu o eleitorado em linhas nĂtidas de classe social e escolaridade, rachou o paĂs em regiĂ”es e estados de preferĂȘncias opostas.
Devagar com o andor. Assim como se impĂ”e desarmar a ĂĄrvore, depois do Natal, impĂ”e-se desarmar os espĂritos, cumprido este outro marco do calendĂĄrio que sĂŁo as eleiçÔes. A divisĂŁo Ă© uma praga que leva as naçÔes Ă perdição. Fidel Castro nĂŁo se recuperou, quase cinqĂŒenta anos passados, do erro de ter dividido o paĂs. Contra ele e seu regime, aguardando a melhor oportunidade, velam inimigos sedentos de vingança. Hugo ChĂĄvez foi pela mesma trilha envenenada. Que neste perĂodo pĂłs-eleitoral nĂŁo se venha com a conversa do impeachment ou do "fora" este ou aquele. NĂŁo hĂĄ paĂs que resista a um impeachment a cada temporada. TambĂ©m nĂŁo hĂĄ vantagem, sĂł mais uma manobra de quem cultiva o esporte do tiro no prĂłprio pĂ©, em destronar um presidente para criar a figura ainda mais poderosa do mĂĄrtir.
Os perdedores devem se consolar com o pensamento de que os governos nĂŁo podem ser tĂŁo diferentes uns dos outros. Fora do sistema nĂŁo hĂĄ salvação. Fora do sistema Ă© condenar-se ao atraso, como Cuba ou CorĂ©ia do Norte, quando nĂŁo Ă fome. Dadas as condicionantes, internas e externas, nĂŁo sobra tanta margem de manobra. Fora do capitalismo nĂŁo hĂĄ salvação. DesejĂĄvel Ă© que o capitalismo seja temperado pelos ideais de justiça e eqĂŒidade. E pronto. Eis no que se resumem as balizas entre as quais embicar o Estado, na presente quadra histĂłrica. Esperar grandes transformaçÔes na passagem de um governo para outro Ă© cair na mesma ilusĂŁo de imaginar, na noite do rĂ©veillon, que no ano que vem serĂĄ tudo diferente.
Que o prĂłximo governo nĂŁo roube, ou roube menos. Que nĂŁo atente contra esse bem precioso, embora negado pelos cegos e mal-intencionados, que Ă© o estado de direito. E que nossos ouvidos sejam poupados (este Ă© um pedido especial) da hĂłrrida retĂłrica do "jamais visto neste paĂs", ou "pela primeira vez em quinhentos anos". O Brasil nĂŁo estĂĄ aĂ para ser inaugurado toda hora. Nenhum paĂs estĂĄ. Achar o contrĂĄrio Ă© fruto da ilusĂŁo, da ignorĂąncia ou da mĂĄ-fĂ©. Que sejamos poupados, inversamente, da idĂ©ia de que se avizinha o fim do mundo. TambĂ©m nĂŁo Ă© assim tĂŁo fĂĄcil chegar ao fim. Apenas cumprimos um rito, como o do Natal, para o qual se arma a ĂĄrvore, e depois se desarma, e no outro ano se arma de novo, e depois se desarma. O Brasil continua.
Roberto Pompeu de Toledo.
Fonte: Veja - edição 1980.
ILUSĂO ORGANIZACIONAL
O discurso Ă© conhecido, as palavras soadas com emoção levam muitos as lĂĄgrimas, mas convenhamos, essa postura politicamente correta sempre me pareceu uma grande ilusĂŁo organizacional. Estou falando sobre a velha pregação de que aqui nessa empresa fazemos parte de uma grande famĂlia, de que as pessoas sĂŁo o que hĂĄ de mais importante. Caso fosse efetivamente o mais importante; salĂĄrio nĂŁo estaria na coluna das despesas, mas sim na de investimentos, o departamento de Recursos Humanos chamaria Desenvolvimento de Seres Humanos, e o processo de demissĂŁo muito mais justo e somente ocorreria em Ășltimo caso, afinal Ă© difĂcil pai ou mĂŁe mandar filho embora, nĂŁo Ă© verdade?
Quero gerar uma reflexão sobre o tema, e pelo amor de Deus, não pense que sou contra as pessoas ou um desses capitalistas selvagens que só pensam no lucro a qualquer custo. Muito pelo contrårio! Somente quero colaborar para que essa grande ilusão afete menos sua carreira, pois palavrinhas como segurança e estabilidade no emprego praticamente jå não existem mais, pelo menos para a grande maioria da população. Pretendo somente ajudå-lo a entender que tudo tem o seu devido lugar. Vamos aos pontos:
Pessoas nĂŁo sĂŁo o que hĂĄ de mais importante na organização. Na verdade o que importa sĂŁo a integração e o equilĂbrio entre o modelo de negĂłcio vigente, as tecnologias e sistemas adotados, os relacionamentos com clientes, fornecedores e comunidade e Ă© claro as pessoas que trazem vida Ă essa empresa. Todos sĂŁo importantes! FuncionĂĄrios e jĂĄ ex-funcionĂĄrios da Varig demonstraram publicamente seu amor Ă empresa. Raça, uma enorme vontade em dar a volta por cima, mas sĂł isso nĂŁo bastou. A empresa tem um modelo de negĂłcio obsoleto, e nĂŁo conseguiu ao longo do tempo se adequar a uma nova realidade. Os resultados todos sabem!
Esforço em demasia nĂŁo comove ninguĂ©m, empresas querem resultados. Trate de sempre pensar em como melhorar o seu desempenho, e isso nĂŁo Ă© sĂł bom para a empresa em que vocĂȘ trabalha. E bom para vocĂȘ, para a sua vida! Nada de ficar estagnado sempre usando as mesmas velhas soluçÔes para os novos problemas. Busque o algo a mais! Trabalhe com inteligĂȘncia e use sua energia em algo que efetivamente trarĂĄ algo de bom e novo para sua organização. Crie sua prĂłpria sorte. Faça mais do que os outros, mas sem acabar com sua saĂșde, relacionamentos amorosos ou boas amizades.
Regras existem para dar um rumo, mas nĂŁo sĂŁo verdades incontestĂĄveis. O mundo estĂĄ cheio de regras e isso Ă© bom! Mas em excesso cria bloqueios que com o tempo se tornam intransponĂveis. Permita-se quebrar algumas regras, fazer algo diferente. Permita que as pessoas da sua equipe experimentem algo novo. Caso hoje fosse proibido vender da forma como vendemos, como irĂamos criar um novo processo de vendas? E tambĂ©m perceba as regras que inibem ou tornam sua empresa mais lenta e burocrĂĄtica. Lembre-se de que regras existem para ajudar e nĂŁo atrapalhar o desenvolvimento das pessoas.
Pode ter certeza, um dia vocĂȘ vai sentir raiva, medo, tristeza ou alegria. VocĂȘ Ă© um ser humano e tem todo o direito de se sentir pressionado ou incomodado. Mas esses sentimentos sĂŁo seus. Perceba como vocĂȘ encara as situaçÔes adversas, inconvenientes e a forma como reage. Isso Ă© determinante para seu sucesso. Tenha atividades que te levem para outro mundo onde possa esquecer de tudo por alguns momentos. Importante: com pessoas de fora da empresa, assim vocĂȘ aprimora o networking e muda um pouco de assunto e ares.
A sua famĂlia estĂĄ na sua casa e nĂŁo na empresa. Mesmo que vocĂȘ trabalhe em um ambiente familiar Ă© importante saber distinguir a vida profissional da pessoal, o relacionamento entre pais e filhos ou entre parentes. A carreira Ă© sua e ao final vocĂȘ vai perceber que tudo dependia de como percebia, interpretava e reagia a cada situação. Tudo pode ser feito de uma maneira diferente, mas somente no presente, o passado jĂĄ era e o futuro ninguĂ©m sabe. Mudanças sĂŁo feitas no presente! Quem tem medo, vive pela metade. Liberte-se do medo. Pergunte sempre: o que de pior pode acontecer se tudo der errado? Mas sem esquecer de tambĂ©m perguntar: o que de melhor pode acontecer se tudo der certo?
Pronto, fim de artigo. NĂŁo se iluda com a sensação de que seu ambiente de trabalho Ă© como aquela famĂlia tĂpica italiana barulhenta, briguenta, mas onde todos se amam. A grande aldeia organizacional Ă© diferente! Com quantos "irmĂŁos" de seu primeiro emprego vocĂȘ ainda se relaciona? E tambĂ©m nĂŁo caia no papo de que as pessoas sĂŁo o mais importante, pois isso cria uma sensação de segurança que jĂĄ nĂŁo existe mais. Como jĂĄ escrevi tudo Ă© interdependente e vocĂȘ tem nada mais do que um contrato de trabalho com sua empresa. Trate de cuidar bem do seu comportamento e atitudes caso queira ter uma histĂłria com um final feliz. O importante nĂŁo Ă© sĂł descobrir os por quĂȘs, mas sim os para quĂȘs de sua carreira.
Paulo AraĂșjo - palestrante e escritor. Autor de Motivação - Hoje e Sempre (editora Qualitymark)
(Colaboração: Brazil & Modal)