BINGO IV - E dĂĄ-lhe charges...
28/05/2007 -
FAZENDO DIREITO
BINGO IV
A justiça é cega.
Veja aonde nĂłs chegamos: no Brasil, ela Ă© cega mesmo...
Confira a charge!
(Colaboração: A.M.B.)
PRĂMIO STELLA AWARDS
DifĂcil de acreditar, mas....essa Ă© a justiça americana. O Stella Awards Ă© um prĂȘmio conferido anualmente aos casos mais bizarros de processos judiciais nos Estados Unidos. O prĂȘmio tem este nome em homenagem a Stella Liebeck, que derrubou cafĂ© quente no colo e processou, com sucesso, o McDonald's, recebendo quase 3 milhĂ”es de dĂłlares de indenização. Desde entĂŁo, o Stella Awards existe como uma instituição independente, publicando - e "premiando" - os casos de maior abuso do jĂĄ folclĂłrico sistema legal norte-americano. Este ano, os vencedores foram:
5Âș. Lugar (empatado): Kathleen Robertson, de Austin, Texas, recebeu US$ 780.000,00 de indenização de uma loja de mĂłveis, por ter tropeçado
numa criancinha que corria solta pela loja e quebrado o tornozelo. AtĂ© aĂ, quase compreensĂvel, se a criança descontrolada em questĂŁo nĂŁo fosse o prĂłprio filho da sra. Robertson.
5o. lugar (empatado): Terrence Dickinson, de Bristol, Pennsylvania, estava saindo pela garagem de uma casa que tinha acabado de roubar. Ele nĂŁo conseguiu abrir a porta da garagem, porque a automação estava com defeito. NĂŁo conseguiu entrar de volta na casa porque a porta jĂĄ tinha fechado por dentro. A famĂlia estava de fĂ©rias e o sr. Dickinson ficou trancado na garagem por oito dias, comendo ração de cachorro e bebendo pepsi de um engradado que encontrou por ali. Ele processou o proprietĂĄrio da casa, alegando que a situação lhe causou profunda angĂșstia mental. Recebeu US$ 500.000, 00.
4Âș. Lugar: Jerry Williams, de Little Rock, Arkansas, foi indenizado com US$ 14.500,00, mais despesas mĂ©dias, depois de ter sido mordido na bunda pelo beagle do vizinho. O cachorro estava na coleira, do outro lado da cerca, mas ainda assim reagiu com violĂȘncia quando o Sr. Williams pulou a cerca e atirou repetidamente contra ele com uma espingardinha de chumbo.
3Âș. Lugar: Um restaurante na FiladĂ©lfia foi condenado a pagar US$ 113.500,00 de indenização a Amber Carson, de Lancaster, Pennsylvania, apĂłs ela ter escorregado e quebrado o cĂłccix. O chĂŁo estava molhado porque, segundos antes, a prĂłpria Amber Carson havia atirado um copo de refrigerante no seu namorado, durante uma discussĂŁo.
2Âș. Lugar: Kara Walton, de Claymont, Delaware, processou o proprietĂĄrio de uma casa noturna da cidade vizinha, por ter caĂdo da janela do banheiro, quebrando os dois dentes da frente. Ela estava tentando escapar do bar sem ter que pagar o couvert (de US$ 3,50). Recebeu US$ 12.000,00, mais despesas dentĂĄrias.
1o. lugar: o grande vencedor do ano foi o sr. Merv Grazinski, de Oklahoma Cty, Oklahoma. O Sr. Grazinski havia recĂ©m comprado um Motorhome Winnebago AutomĂĄtico e estava voltando sozinho de um jogo de futebol, realizado em outra cidade. Na estrada, ele marcou o piloto automĂĄtico do carro para 100 km/h, abandonou o banco do motorista e foi para a traseira do veĂculo preparar um cafĂ©. Quase como era de se esperar, o veĂculo saiu da estrada, bateu e capotou. O sr. Grazinski processou a Winnebago por nĂŁo explicar no manual que o piloto automĂĄtico nĂŁo permitia que o motorista abandonasse a direção. O jĂșri concedeu a indenização de US$ 1.750.000,00, mais um novo
Motorhome Winnebago . A companhia mudou todos os manuais de proprietĂĄrio a partir deste processo, para o caso de algum outro retardado mental comprar seus carros.
(Colaboração: Viana)
A JUSTIĂA CARNAVALIZADA DO BRASIL
EXISTE NO PAĂS uma Justiça especial para o estamento dos polĂticos, dos altos burocratas, dos mais ricos, dos notĂłrios, das celebridades e, enfim, daqueles que "conhecem alguĂ©m" -nĂŁo vale conhecer um "zĂ© ninguĂ©m". Temos, na prĂĄtica, um conceito avacalhado de fidalguia, tĂpico de um paĂs em que a mobilidade social, embora muito restrita, Ă© intensa; em que o favor ainda Ă© norma e o Estado Ă© grande e despoliciado o bastante para prover muito agrado. Essa comunidade de gente de prestĂgio, com aura midiĂĄtica, polĂtica e econĂŽmica, tem foro privilegiado de Justiça.
NĂŁo se trata aqui da instituição formal e tambĂ©m deplorĂĄvel dos tribunais especiais, das imunidades e de conselhos administrativos para julgar os rolos de grande empresa e bancos, alĂ©m do direito de cadeia diferenciada para bacharĂ©is, por exemplo. O foro privilegiado Ă© o da parĂłdia da Justiça que vemos em CPIs, shows de algemas, prisĂ”es temporĂĄrias e "denĂșncias", das quais raramente enxergamos resultados prĂĄticos. Criamos uma instituição informal de Justiça, o tribunal carnavalizado.
A carnavalização da Justiça pode ser apreciada com mais clareza durante os "escĂąndalos", em especial os polĂticos, naqueles momentos de transe moral e de expiação ritualĂstica de CPIs. O paĂs em parte gosta do justiçamento social e novelesco, praticado por meio de vazamento de processos, das arapongagens, da lavagem inconseqĂŒente de roupa suja.
O paĂs nĂŁo apenas gosta disso como essa Ă© a forma que restou para conter um tico da rapina do Estado, pois os tribunais de fato nĂŁo funcionam.
A figura pĂșblica que se torna objeto de "denĂșncias" nem bem Ă© absolvida nem condenada Ă cana dura. Na Justiça do estamento de "alguĂ©ns", arranha-se o prestĂgio, a fama e, como decorrĂȘncia ocasional, retira-se parcela do poder e dos rendimentos que em geral estĂŁo associados a esses atributos. A punição dos "alguĂ©ns" Ă© apenas um estigma. Tal mĂĄcula se enfrenta com galhardia mais ou menos cĂnica. Incapacita o "joĂŁo alguĂ©m" de forma provisĂłria e atenuada, o condena a uma vida mais sorrateira ou a uma atuação pĂșblica mais escamoteada. Essa Ă© a "pena" dos "alguĂ©ns": pairar no limbo dos "envolvidos" nisso ou naquilo, um ostracismo moral, polĂtico ou mundano que pode durar semanas ou anos. Essa Ă© a Justiça real do Brasil do estamento, nĂŁo a dos manuais.
Nos paroxismos de indignação Ă© recorrente a farsa da refundação, da "limpeza Ă©tica", das reformas polĂticas, da indignação com as ameaças ao "Estado de Direito" (que quase inexiste). Ă a hora do transe salvacionista, de surtos pequeno-burgueses pela "Ă©tica na polĂtica", tĂŁo irrelevantes como aqueles "movimentos pela paz" que se sucedem a chacinas e ao trucidamento de cidadĂŁos por bandidos comuns, criminosos policiais, milĂcias privadas legais e esquadrĂ”es da morte.
A Justiça carnavalizada Ă© uma instituição tĂpica de um paĂs em que as leis "pegam" ou "nĂŁo pegam". Como resposta, alĂ©m da reação dramĂĄtica, novelesca, sentimental, as providĂȘncias sugeridas ou mesmo adotadas, sĂŁo formalistas: leis "duras" e reformas institucionais que logo sĂŁo adaptadas pelo estamento bandalho para servir Ă prĂłxima onda de rapina e ruĂna dos direitos de cidadania.
VinĂcius Torres Freire.
Fonte: Folha de S.Paulo - 29/05/2007.
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