SEJA COMPETENTE
07/05/2007 -
PENSE!
"Se perdermos até a esperança, não hå caminho para nós".
(Ariano Suassuna, escritor - 2004)
PALAVRA DA SEMANA: COMPETENTE
Em inglĂȘs, competition quer dizer "concorrĂȘncia" (mesmo sentido do espanhol competencia). Em latim, as duas palavras eram sinĂŽnimas: competere significava "mirar no mesmo alvo" e concurrere era "correr junto". Numa avaliação de desempenho em portuguĂȘs, "competente" Ă© alguĂ©m que executa muito bem seu trabalho. Mas, se a avaliação for em inglĂȘs, o sentido muda: competent Ă© quem sĂł fez o mĂnimo esperado. AlguĂ©m que apenas competiu, mas nĂŁo levou.
Max Gheringer - Fonte: Ăpoca - nĂșmero 469.
PARA NĂO FALAR SĂ DO AMOR
E aqui estou eu novamente tentando colocar no papel mais uma reflexĂŁo sobre as mĂŁes, agora que se aproxima o segundo domingo do mĂȘs de maio, o abençoado dia das mamĂŁes.
Decidi entĂŁo, sĂł pra variar, que dessa vez eu nĂŁo iria abraçar o amor como recurso para me referir Ă s queridas mamĂŁes, e confesso que nĂŁo foi nada fĂĄcil. Ă incrĂvel como sempre ao nos referirmos Ă mĂŁe, imediatamente lembramos de amor. Na verdade atĂ© sĂŁo palavras diferentes na grafia e morfologia, porĂ©m tĂȘm tudo a ver uma com a outra. E jĂĄ estou eu outra vez falando de amor, quando deveria falar de mĂŁe.
MĂŁe pode significar fortaleza, ainda que esteja fraca. De algum lugar ela descola força suficiente para suprir seus filhos de tudo que eles necessitam. Isso Ă© zĂȘlo.
MĂŁe Ă© paciĂȘncia. Quem nesse mundo tenta de tudo e mais um pouco para extrair um sorriso de nossos lĂĄbios, ou uma bela garfada de comida ou uma colherada de papinha: E ela consegue! Isso Ă© dedicação.
Mãe é alegria. Ainda que não esteja tão alegre assim. Mas no seu coração hå sempre um sopro de sorriso, mesmo que dos filhos receba uma malcriação, tão incompreensivos que somos. Isso é tolerùncia.
MĂŁe Ă© motivação. Por mais desanimado que tudo possa parecer. Uma dificuldade qualquer que enfrentamos. Uma insegurança frente a algum desafio. Um medo. Uma prova. Uma entrevista de emprego. LĂĄ estĂĄ a mamĂŁe dando a maior força e nos deixando muitas vezes atĂ© mais confiantes do que deverĂamos estar. Tudo simplesmente porque âminha mĂŁe falou!â. Isso Ă© força.
Mãe é magia e mediunidade. Tudo ela sabe. E nos conhece tão bem que parece até brincadeira. à capaz de nos dar a previsão do tempo e ainda nos tratar com um chazinho bem quentinho, caso a gente não leve o guarda-chuva, como ela havia sugerido, e retorne para casa todo molhado. Isso é intuição.
MĂŁe Ă© muito mais e por mais que se mencione, ainda nĂŁo Ă© satisfatĂłrio. Isso Ă© plenitude.
PaciĂȘncia, alegria, motivação, magia. Ă quase assim, como ficamos quando estamos apaixonados. Exatamente como elas se sentem em relação a nĂłs, os filhos. Perdidamente apaixonadas. E tudo isso nĂŁo se traduz com nenhuma outra palavra a nĂŁo ser aquela que me propuz a nĂŁo lançar mĂŁo para me referir a mĂŁe. Mas eu nĂŁo consegui. MĂŁe Ă© amor na sua mais alta plenitude. E amor nĂŁo se traduz melhor do que o prĂłprio amor.
Ăs mamĂŁes que me lĂȘem, minha profunda admiração, meu respeito e reconhecimento por tudo que elas representam, traduzem e transmitem. Como filho peço a sua benção, pois alĂ©m de tudo ela tem ainda mais esse dom. Nos abençoa como ninguĂ©m na face da Terra. MĂŁe realmente Ă© amor.
Eddy
SĂŁo Paulo, 11 de maio de 2007
O PAPA, FREI GALVĂO E O RELATIVISMO
O santo brasileiro,lå em cima, seria mais tolerante com os usos do século XXI do que Bento XVI.
Um discreto casamento foi celebrado no sĂĄbado 5, na capela do velho Mosteiro da Luz, em SĂŁo Paulo. Os noivos eram Sandra Grossi de Almeida e CĂ©sar Augusto Gallafassi, os dois de SĂŁo Paulo, mas moradores de BrasĂlia. NĂŁo chegavam a setenta as pessoas presentes. Eram elas parentes, amigos, fiĂ©is que por acaso Ă quela hora se encontravam na capela e dois profissionais que os noivos gostariam que nĂŁo estivessem por perto â a repĂłrter Laura Capriglione e o fotĂłgrafo Leonardo Wen, da Folha de S.Paulo. Graças a eles, na segunda-feira a notĂcia do casamento saĂa, com texto e fotos, no jornal. Com isso, vinha Ă tona um curioso detalhe da histĂłria da canonização de frei GalvĂŁo, o primeiro santo genuinamente brasileiro.
Sandra Grossi de Almeida Ă© a protagonista do segundo e decisivo milagre atribuĂdo a frei GalvĂŁo. Seu sonho de ser mĂŁe, acalentado desde cedo, resultou duas vezes em frustração. Por causa de uma mĂĄ-formação do Ăștero, ela teve, nas duas vezes, abortos espontĂąneos. Em 1999, aos 30 anos, apesar das experiĂȘncias pregressas e das advertĂȘncias dos mĂ©dicos, engravidou pela terceira vez. Repetiu-se a provação. Teve sangramentos desde o inĂcio, e tudo indicava que a aguardava o mesmo infeliz desfecho quando, por sugestĂŁo de uma amiga, ingeriu trĂȘs das famosas pĂlulas de frei GalvĂŁo. Os sangramentos cessaram, e Sandra pĂŽde dar Ă luz um menino a quem ela e o pai da criança, CĂ©sar, deram o nome de Enzo. A comissĂŁo cientĂfica encarregada pelo Vaticano de examinar o caso concluiu que, dadas as condiçÔes de Sandra, sĂł o sobrenatural, no caso impulsionado pelas pilulinhas de papel inventadas pelo frade brasileiro, poderia lhe ter propiciado o nascimento do filho. O Vaticano jĂĄ avalizara outro milagre atribuĂdo ao brasileiro â a cura da menina Daniela Cristina da Silva de uma hepatite. Com o caso de Sandra, chegava-se a dois milagres, o nĂșmero mĂnimo exigido para elevar alguĂ©m a santo.
O que a celebração da capela da Luz trouxe à tona é que Sandra e César, na época do nascimento de Enzo, não eram casados na Igreja. Nem por isso se deixou de presenciar uma bonita cerimÎnia. A Enzo, um menino vivo e alegre, hoje com 7 anos, coube entregar as alianças aos pais. Mas melhor ainda seria, do ponto de vista dos noivos, se não tivesse havido a presença de jornalistas. Sandra, dias antes, conversara com outro repórter da Folha de S.Paulo, Fåbio Victor. Chegou a dizer-lhe que no såbado estaria em São Paulo, mas omitiu o motivo da viagem. Fåbio Victor perguntou se Enzo ia junto, e ela respondeu que não. Mais tarde o repórter entrevistou uma das responsåveis pela escola em que Enzo estuda. A entrevistada, a certa altura, deixou escapar que Enzo no såbado iria a São Paulo. "Ele vai para o casamento da mãe", acrescentou.
Foi assim que a notĂcia de que havia um casamento no ar chegou Ă redação da Folha. Concluir que se daria na capela da Luz era fĂĄcil. O mosteiro, do sĂ©culo XVIII, foi construĂdo por frei GalvĂŁo, que nesse labor empenhou seus dotes de arquiteto, mestre-de-obras e pedreiro. SĂŁo as freiras que ali habitam que fabricam e distribuem as pĂlulas. E frei GalvĂŁo estĂĄ enterrado na capela. Tudo ali, em suma, lembra o santo. O casal nĂŁo escolheria outro local. Depois do casamento, a repĂłrter Laura Capriglione falou com a noiva. "NĂŁo autorizo a publicação da notĂcia", disse esta. Laura lembrou que nĂŁo havia como nĂŁo autorizar, pois casamentos sĂŁo atos pĂșblicos. A repĂłrter perguntou em seguida se o casamento tinha sido precipitado pela iminĂȘncia da canonização do frade. Sandra disse que nĂŁo. O dia fora escolhido em homenagem a seus pais, que tambĂ©m casaram num 5 de maio.
O papa Bento XVI iniciou seu pontificado avisando que com ele nĂŁo haveria lugar para relativismo. Por relativismo, entende-se a transigĂȘncia com os princĂpios da fĂ© e os valores humanos que a Igreja considera fundamentais. Bento XVI comprometeu-se, dessa forma, com um programa de alto risco. Defende a qualidade sobre a quantidade. Quer fiĂ©is observantes das determinaçÔes da Igreja, mesmo que ao custo de perder parte do rebanho. O que tem em vista Ă© desferir um golpe de morte no laxismo que, mais do que os fiĂ©is de outras religiĂ”es, caracteriza os catĂłlicos, uma coletividade que vai cada vez menos Ă missa e dĂĄ cada vez menos ouvidos a ordens como nĂŁo praticar o sexo antes do casamento, nĂŁo adotar mĂ©todos anticoncepcionais, nĂŁo se divorciar e nĂŁo recorrer ao aborto.
Eis no entanto â suprema surpresa â que o prĂłprio Vaticano deixa passar uma grande relativizada ao aceitar como milagre o nascimento do filho de um casal que, aos olhos da Igreja, vivia em pecado. De duas, uma. Ou bem o prĂłprio Vaticano, no fundo, reconhece como inviĂĄvel o caminho da rigidez, ou bem frei GalvĂŁo, um homem da virada do sĂ©culo XVIII para o XIX, mas que lĂĄ em cima tem tido tempo de sobra para atualizar-se, encara os usos da sociedade do sĂ©culo XXI de forma mais suave do que Bento XVI. Sim, eles viviam em pecado, mas tambĂ©m mereceriam um milagresinho.
Roberto Pompeu de Toledo - Fonte: Veja - edição 2008.
JULGAMENTO
Havia numa aldeia um velho muito pobre que possuĂa um lindo cavalo branco. Numa manhĂŁ ele descobriu que o cavalo nĂŁo estava na cocheira. Os amigos disseram ao velho:
- Mas que desgraça, seu cavalo foi roubado!
E o velho respondeu:
- Calma, nĂŁo cheguem a tanto. Simplesmente digam que o cavalo nĂŁo estĂĄ mais na cocheira. O resto Ă© julgamento de vocĂȘs.
As pessoas riram do velho. Quinze dias depois, de repente, o cavalo voltou. Ele havia fugido para a floresta. E nĂŁo apenas isso; ele trouxera uma dĂșzia de cavalos selvagens consigo. Novamente as pessoas se reuniram e disseram:
- Velho, vocĂȘ tinha razĂŁo. NĂŁo era mesmo uma desgraça, e sim uma benção.
E o velho disse:
- VocĂȘs estĂŁo se precipitando de novo. Quem pode dizer se Ă© uma benção ou nĂŁo? Apenas digam que o cavalo estĂĄ de volta...
O velho tinha um Ășnico filho que começou a treinar os cavalo selvagens. Apenas uma semana mais tarde, ele caiu de um dos cavalos e fraturou as pernas. As pessoas se reuniram e, mais uma vez, se puseram a julgar:
- E nĂŁo Ă© que vocĂȘ tinha razĂŁo, velho? Foi uma desgraça seu Ășnico filho perder o uso das duas pernas.
E o velho disse:
- Mas vocĂȘs estĂŁo obcecados por julgamentos, hein? NĂŁo se adiantem tanto. Digam apenas que meu filho fraturou as pernas. NinguĂ©m sabe ainda se isso Ă© uma desgraça ou uma bĂȘnção.
Aconteceu que, depois de algumas semanas, o paĂs entrou em guerra e todos os jovens da aldeia foram obrigados a se alistar, menos o filho do velho. E os que foram pra guerra, morreram...
Quem é obcecado por julgar, cai sempre na armadilha de basear seu julgamento em pequenos fragmentos de informação, o que o levarå a conclusÔes precipitadas. Nunca encerre uma questão de forma definitiva, pois quando um caminho termina, outro começa, quando uma porta se fecha outra se abre...
(Colaboração: Waldeyr)