TEMPO, FRASES, ANÚNCIOS DE EMPREGO...
NOME DA SEMANA: PARKINSON - Cyril Northcote Parkinson (1909-1993), jornalista inglês, formulou a lei básica dos escritórios de outrora: "Todo trabalho se expande até preencher o tempo disponível". Atualmente, as empresas fazem o contrário: aumentam o volume de trabalho, acreditando que ele sempre se encaixará no tempo disponível.
(Max Gehringer)
Fonte: Época - Nr. 460.
FRASES DO MILLÔR
"Humor? Caras de bom senso, bons pais de família, respeitadores de todos os princípios, obrigados por assaltante a tirar a roupa e ficar nus dentro do ônibus. Isso é humor. Em qualquer país, negro. Aqui, normal."
"Só conheço uma verdade: mentimos sem parar."
"Um recém-nascido é a prova de que, apesar de tudo isso que vocês fazem com ela, a natureza ainda não desistiu do ser humano."
"As lições de economia entram por um bolso e saem pelo outro."
"Vocês podem não concordar, mas acho que o Lula fala quase tanta besteira quanto o Fernando Henrique. Só que este não apenas fala, escreve-AS."
"O que é Cultura, senão a ampliação da nossa ignorância?"
Fonte: Veja - Edição 1.999.
MAX GEHRINGER - Colunista da Revista EXAME e VOCÊ S/A.
Vi um anúncio de emprego. A vaga era de gestor de atendimento interno, nome que agora se dá à seção de serviços gerais. E a empresa contratante exigia que os eventuais interessados possuíssem sem contar a formação superior, liderança, criatividade, energia, ambição, conhecimentos de informática, fluência em inglês e não bastasse tudo isso, ainda fossem hands on.
Para o felizardo que conseguisse convencer o entrevistador de que possuía mesmo essa variada gama de habilidades, o salário era um assombro: 800 reais. Ou seja, um pitico. Não que esse fosse algum exemplo absolutamente fora da realidade. Pelo contrário, ele é quase o paradigma dos anúncios de emprego atuais. A abundância de candidatos está permitindo que as empresas levantem, cada vez mais, a altura da barra que o postulante terá de saltar para ser admitido.
E muitos, de fato, saltam. E se empolgam. E aí vêm as agruras da superqualificação, que é uma espécie do lado avesso do efeito pitico...
Vamos supor que, após uma duríssima competição com outros Candidatos tão bem preparados quanto ela, a Fabiana conseguisse ser admitida como gestora de atendimento interno... E um de seus primeiros clientes foi o seu Borges, gerente da contabilidade.
- Fabiana, eu quero três cópias deste relatório.
- In a hurry!
- Saúde.
- Não, isso quer dizer "bem rapidinho". É que eu tenho fluência em inglês. Aliás, desculpe perguntar, mas por que a empresa exige fluência em inglês se aqui só se fala português?
- E eu sei lá? Dá para você tirar logo as cópias?
- O senhor não prefere que eu digitalize o relatório? Porque eu tenho profundos conhecimentos de informática.
- Não, não .. Cópias normais mesmo.
- Certo. Mas eu não poderia deixar de mencionar minha criatividade. Eu já comecei a desenvolver um projeto pessoal visando eliminar 30% das cópias que tiramos.
- Fabiana, desse jeito não vai dar!
- E eu não sei? Preciso urgentemente de uma auxiliar.
- Como assim?
- É que eu sou líder, e não tenho ninguém para liderar. E considero isso um desperdício do meu potencial energético.
- Olha, neste momento, eu só preciso das três có...
- Com certeza. Mas antes vamos discutir meu futuro...
- Futuro? Que futuro?
- É que eu sou ambiciosa. Já faz dois dias que eu estou aqui e ainda não aconteceu nada.
- Fabiana, eu estou aqui há 18 anos e também não me aconteceu nada!
- Sei. Mas o senhor é hands on?
- Hã?
- Hands on. Mão na massa.
- Claro que sou!
- Então o senhor mesmo tira as cópias. E agora com licença que eu vou sair por aí explorando minhas potencialidades. Foi o que me prometeram quando eu fui contratada.
Então, o mercado de trabalho está ficando dividido em duas facções:
1 - Uma, cada vez maior, é a dos que não conseguem boas vagas porque não têm as qualificações requeridas.
2 - E o outro grupo, pequeno, mas crescente, é o dos que são admitidos porque possuem todas as competências exigidas nos anúncios, mas não poderão usar nem metade delas, porque, no fundo, a função não precisava delas.
Alguém ponderará - com justa razão - que a empresa está de olho no longo prazo: sendo portador de tantos talentos, o funcionário poderá ir sendo preparado para assumir responsabilidades cada vez maiores.
Em uma empresa em que trabalhei, nós caímos nessa armadilha. Admitimos um montão de gente superqualificada. E as conversas ficaram de tão alto nível que um visitante desavisado que chegasse de repente confundiria nossa salinha do café com o auditório da Fundação Alfred Nobel. Pessoas superqualificadas não resolvem simples problemas!
Um dia um grupo de marketing e finanças foi visitar uma de nossas fábricas e no meio da estrada, a van da empresa pifou. Como isso foi antes do advento do milagre do celular, o jeito era confiar no especialista, o Cleto, motorista da van. E aí todos descobriram que o Cleto falava inglês, tinha noções de informática e possuía energia e criatividade. Sem mencionar que estava fazendo pós-graduação. Só que não sabia nem abrir o capô.
Duas horas depois, quando o pessoal ainda estava tentando destrinchar o manual do proprietário, passou um sujeito de bicicleta. Para horror de todos, ele falava "nóis vai" e coisas do gênero. Mas, em 2 minutos, para espanto geral, botou a van para funcionar. Deram-lhe uns trocados, e ele foi embora feliz da vida. Aquele ciclista anônimo era o protótipo do funcionário para quem as empresas modernas torcem o nariz: O que é capaz de resolver, mas não de impressionar.
(colaboração: OB Cheiroso)
FRANKENSTEIN NA VOLTA ÀS AULAS
A nova Secretaria de Ensino Superior ainda não disse a que veio, e os primeiros sinais que emitiu sobre si própria não são alentadores.
NA VOLTA às aulas, o ambiente universitário terá de conviver com uma nova criatura, por ora ainda meio desapercebida numa névoa de confusão ou de programática cortina de fumaça: a Secretaria de Ensino Superior.
Gerada pelos decretos do primeiro dia do governo Serra que intervêm na autonomia de gestão financeira, administrativa e tecnocientífica das universidades estaduais paulistas, a nova secretaria ainda não disse a que veio, e os primeiros sinais que emitiu sobre si própria não são alentadores.
De início, a nova secretaria, estranhamente híbrida, pois sucedânea da Secretaria de Turismo, reclamava para si a presidência do Conselho de Reitores (Cruesp), o que não chegou a vingar. Com o alerta geral, foi restituída a quem de direito -os reitores-, embora se mantendo o aumento do titular da secretaria recém-criada na composição do órgão. A sua presença, ao lado dos secretários de Desenvolvimento e da Educação, continua a dar, na prática, vantagem ao governo.
O "engano" do decreto que, entre outras coisas, depusera a reitora da USP do cargo sem aviso prévio foi só em parte reparado, e questões de fundo permanecem intocadas.
As universidades públicas paulistas, comprometidas com a pesquisa, além do ensino e da extensão, foram incompreensivelmente apartadas da Secretaria de Ciência e Tecnologia, onde sempre estiveram bem situadas.
O efeito paradoxal da nova situação é o predomínio de uma concepção divisionista entre pesquisa e ensino, como a que existe nas universidades privadas, que serão, aliás, de longe, o contingente maior da nova secretaria.
Também foi englobada por ela, de modo a acentuar sua forma híbrida e arbitrária, o Memorial da América Latina, que pouco tem a ver com ensino superior, mas, curiosamente, ficaram fora dela as Fatecs, mais afins ao rótulo que engendra o novo ente. A Fapesp, por sua vez, decisiva para o incremento da pesquisa nas universidades, fica livre da companhia delas na doravante Secretaria do Desenvolvimento, da qual até os termos ciência e tecnologia foram banidos.
Ante essa criatura mal ajambrada, que só leva à hipertrofia da máquina estatal que o governador diz querer enxugar, várias perguntas não calam.
Por que a melhor pesquisa científica, tecnológica e em humanidades e a melhor educação superior pública do país devem ser lançadas na vala comum da indústria privada de diplomas, que ora o secretário Pinotti pretende refundar sob a alcunha de "Sistema de Ensino Superior do Estado"?
Por que arrastar o setor de ponta da formação superior de professores e pesquisadores para o mesmo processo de mediocrização que gerou o desmanche da escola básica, fundamental e média, processo de que os governantes são artífices ou cúmplices, no Brasil e, muito vergonhosamente, no Estado de São Paulo, conforme demonstram, com dados terríveis, reportagem de capa e caderno especial desta Folha, em 8/2, e, agora, em 6/3, na reprovação de todas as mais de 600 escolas estaduais da capital paulista no último Enem?
O pacote de boas intenções do secretário Aristodemo Pinotti e do secretário-adjunto Eduardo Chaves é flagrantemente extemporâneo. Está claro que não se vai resgatar pelo fim a calamidade começada cedo. Ademais, uma preocupação séria com a efetiva melhora do ensino básico, fundamental e médio constituiria matéria desde sempre afeita à Secretaria da Educação. Querer transferir essa responsabilidade para as universidades estaduais nos parece manobra diversionista e demagógica. Nossas licenciaturas, das melhores do país, continuam a formar excelentes professores, que só não são aproveitados como deviam porque o governo lhes falta com infra-estrutura, vagas, salários e carreiras decentes.
Se governos anteriores do Estado mais rico da Federação foram incapazes ou negligentes em priorizar políticas e recursos para salvar uma educação falida, por que criar mais essa secretaria, com se sabe lá quantos novos postos, que, afora a acomodação de aliados, maldisfarçada num baú de idéias anacrônicas, não parece servir para nenhuma boa causa?
A não ser que, ao dispersar gastos e fragmentar políticas, a secretaria frankensteiniana seja mais uma cortina de fumaça ante os grandes dilemas da educação brasileira, dos quais em geral todos os governos federais, estaduais e municipais têm irresponsavelmente se furtado, entre subterfúgios e parolagens.
ALCIR PÉCORA, 52, crítico literário, é diretor do IEL-Unicamp (Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas).
FRANCISCO FOOT HARDMAN, 54, é professor titular de teoria e história literária e coordenador de Pesquisa do IEL-Unicamp. Foi editorialista da Folha.
Fonte: Folha de S.Paulo - 07/03/07.