FM - Faculdade Mental

COLUNA DO CANALHA - 19/06/2009

FESTA DE 18 ANOS
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A FESTA
Por conta da dona da festa, eu e um casal de amigos fomos os primeiros a chegar, mais de uma hora antes dos outros. PrivilÃ©gio, eu diria.
Festa de aniversÃ¡rio de 18 anos de uma grande amiga, rolou, de cara, um Martini Bianco geladinho. Tava muito bom. Animado.
Papo vai, papo vem, foi-se o Martini. NÃ£o levou 45 minutos.
Mas, era festa de 18 anos da amiga, nÃ£o ia faltar Martini. E nÃ£o faltou.
Eis que aparece a irmÃ£ gÃªmea da garrafa anterior, e mais uma hora se passou e mais um Martini se foi. Ainda estÃ¡vamos em quatro.
Recado, direto: pra vocÃªs dois, no caso eu e o namorado da outra amiga, acabou o Martini. Se quiser pega cerveja no tanque. E era garrafa, latinha era caro nessa Ã©poca.
E comeÃ§ou a chegar gente, bebemos uma, bebemos duas, bebemos trÃªs, e na quarta, eis que ao invÃ©s de uma cerveja sai um terceiro Martini. Ã‰ramos seis em volta do tanque.
Morreu a garrafa em meia hora.
E a festa tava muito animada.
Muita mÃºsica, muita risada, muita felicidade, muita comida, um ambiente gostoso, uma energia de festa onde todos sÃ£o amigos.
Tinha danÃ§a, Ã s vezes passava um vinho tinto na parada, outra hora uma batidinha de maracujÃ¡, atÃ© que exatamente a meia noite fomos interrompidos pelo pai da aniversariante informando que haveria naquele momento uma valsa. E danÃ§aram a valsa.
Todo brindou com um espumante, na Ã©poca chamado de Champagne mesmo, a saÃºde da minha amiga.
Fumante que jÃ¡ era na Ã©poca, fui atÃ© a varandinha da sala fumar um cigarro, onde tinha uma cadeira de balanÃ§o de madeira, pra duas pessoas.
Acendi o cigarro, dei uns dois tragos, e sentei na cadeira.
Fim de festa. Pra mim nÃ£o, pra eles, pois daquele momento em diante me lembro de pouquÃssimos momentos, mas relato a seguir o que me contaram.
Teria eu ido para o banheiro, ficado por lÃ¡ mais de uma hora, a tal ponto que tive de ser convencido a abrir a porta depois de muita negociaÃ§Ã£o.
Aberta a porta, a situaÃ§Ã£o cadavÃ©rica do presente relatante era tal que foi necessÃ¡rio providenciar um banho de Ã¡gua gelada, de muito pouco efeito, motivo pelo qual teria sido providenciada uma cÃ¢nfora ou amÃ´nia a fim de provocar uma reaÃ§Ã£o de vida.
JÃ¡ estar no quarto deitado na cama com cerca de 30 pessoas em volta eu me lembro um pouco. Lembro da avÃ³ da minha amiga passando fronhas no ferro de passar para aquecer meus pÃ©s que estariam tÃ£o gelados quanto aquela Ãºltima garrafa de Martini morta em meia hora.
AÃ jÃ¡ me lembro tambÃ©m de uma pessoa de branco com cara de mÃ©dico mas nÃ£o me lembro de ter tomado injeÃ§Ã£o, mas tomei. Glicose na veia pelo que me contaram.
E aÃ eu apaguei de vez.
JÃ¡ era "madrugadona", creio que quatro e meia da manhÃ£, quando dei uma acordada.
Abri os olhos, tudo escuro. Eu nÃ£o sabia onde tava. TambÃ©m nÃ£o enxergava nada com aquela escuridÃ£o.
Resolvi apoiar o braÃ§o na cama pra inclinar o corpo pra cima, quando senti que tinha uma mÃ£o segurando no meu braÃ§o esquerdo. Era Jean Paul Albert de Aush Bernard, o noivo da irmÃ£ da minha amiga, deitado num colchonete no chÃ£o ao lado da cama onde eu estava.
(Tenho que fazer uma interrupÃ§Ã£o aqui. AtÃ© entÃ£o procurei omitir os nomes das pessoas citadas, ao invÃ©s de dar nomes fictÃcios a elas. Mas um cara que se chama Jean Paul Albert de Aush Bernard â€“ cuja grafia correta confirmarei posteriormente â€“ nÃ£o dÃ¡ pra esquecer e nÃ£o citar, que me perdoe Jean Paul.)
O sujeito tava segurando meu braÃ§o simplesmente porque foi delegada a ela a tarefa de ver se eu morria ou nÃ£o. Ele tava segurando o meu pulso.
NÃ£o sei quem se assustou mais com a situaÃ§Ã£o, eu com aquela mÃ£o no meu pulso, ou ele tendo a sensaÃ§Ã£o de que o defunto tinha ressuscitado.
Passado o constrangimento, ele viu que eu tava bem, finalmente largou meu braÃ§o e dormiu. E eu me ajeitei e fiz a mesma coisa.
Acordei vendo a claridade na janela, uma cara de nove horas da manhÃ£.
Sentei na cama pra sentir o ambiente e de repente eu descobri o tamanho do estrago que tinha feito. Veio tudo Ã cabeÃ§a na mesma hora. Inclusive uma ressaca alcoÃ³lica e de moral.
Eu queria apenas sumir, desaparecer, nÃ£o ter que em hipÃ³tese alguma sair por aquela porta, e adoraria proibir tambÃ©m que alguÃ©m entrasse; eu precisava de um lapso de tempo, um portal dimensional, uma pÃlula pra ficar invisÃvel, da minha mÃ£e, qualquer coisa, menos atravessar aquela porta. Mas eu nÃ£o ia ficar ali o dia inteiro, tinha que enfrentar, ou, quem sabe, tentar sair de fininho, era uma possibilidade. E como era nove e meia, todo mundo bebeu, dormiu tarde, devia ter muita gente dormindo ainda.
Vi que eu estava sozinho no quarto, achei minhas roupas, vesti, e fui, nas pontas dos pÃ©s, auscultar atrÃ¡s da porta. Tava tudo silencioso.
O banheiro ficava a minha direita. A porta da rua a minha esquerda. Mas, pra chegar nela passava pela porta da sala a direita e pelo corredor que levava Ã cozinha a esquerda.
Abri a porta do quarto bem de leve, confirmei o silÃªncio, e corri pro banheiro pra ver minha real situaÃ§Ã£o.
Eu tava mal. Muito mal.
Meus olhos nÃ£o tinham olheiras. Minhas olheiras Ã© que tinham olhos.
Eu tava branco cor de cera. Abre uma lata de cera branca e olha como Ã© aquela cor. Eu tava desse jeito.
Como eu ia chegar em casa e olhar na cara do meu pai, que aquela altura jÃ¡ sabia do fato atravÃ©s do meu irmÃ£o que estava na festa? Como eu ia pegar um Ã´nibus pra ir pra casa daquele jeito? E a pergunta mais importante: como eu ia passar por aquele corredor e sair fora absolutamente Ã francesa?
Lavei o rosto, fingi que me achei melhor aparentado, e comecei minha rota de fuga.
Eu estava de frente para o corredor. Respirei fundo (e quase caÃ pra traz de tonto que fiquei), abri a porta e passo a passo me aproximei da porta da sala.
Tinha uma televisÃ£o ligada, tava passando FÃ³rmula 1.
Dei uma espiadela e vi que tinha alguÃ©m sentado vendo a corrida, de costas pra mim.
Preparei, impulsionei o passo e quando tava no meio da porta ouvi a seguinte frase dita pelo pai da minha amiga: quem toma porre na minha casa nÃ£o sai dela desse jeito nÃ£o.
Se eu nÃ£o tivesse acabado de fazer o xixi de todo aquele Martini, da cerveja, do Champagne, do vinho, da batida de pÃªssego e do espumante, eu teria feito ali naquela hora.
Eu tava petrificado, suando, tremendo, e quando o vi se levantando e vindo na minha direÃ§Ã£o eu quis ser uma ameba.
Pois ele veio, parou na minha frente e completou: quem toma porre na minha casa, almoÃ§a na minha casa.
Perguntou se eu estava bem, me fez sentar Ã mesa e logo veio a comida.
Eu estava enganado sobre o horÃ¡rio. JÃ¡ era meio dia.
Levei um bocado de gozaÃ§Ã£o da famÃlia e sou amigo de todos atÃ© hoje.
Passei a odiar Martini.
(*eis que as 2:25 da manhÃ£, consegui achar a ex-noiva no orkut e veio a confirmaÃ§Ã£o do nome correto do sujeito: Jean Paul Albert de Aush Bernhardt)