FM - Faculdade Mental

EDITORIAL - 15/05/2008

COTAS NAS UNIVERSIDADES

O APARTHEID MULTIRRACIAL

Somos um paÃs multirracial.
Preconceituoso, discriminador, atrasado, mas multirracial.
Pardos, negros, mulatos, cafuzos, confusos, brancos, mestiÃ§os...
Nas nossas veias correm basicamente sangues indÃgenas, europeus e africanos.
A lei Ãurea acaba de completar cento e vinte anos, nossa prÃ³pria histÃ³ria pouco passa dos quinhentos anos e pouco evoluÃmos na criaÃ§Ã£o de uma sociedade justa; e nÃ£o se trata apenas de distribuiÃ§Ã£o de renda, pois diz a constituiÃ§Ã£o que a lei Ã© igual para todos, ricos e pobres, altos e baixos, gordos e magros, negros e brancos.
Mas a gente sabe que nÃ£o Ã©. Ou melhor, Ã©, mas nÃ£o consegue ser.
A discriminaÃ§Ã£o nÃ£o comeÃ§a pela cor e sim pela posse.
Se vocÃª Ã© rico e joga sua filha pela janela, pague um bom advogado e ele consegue que vocÃª espere o julgamento em liberdade, sendo preto ou branco. O que vale Ã© ter o dinheiro pra pagar o advogado.
PorÃ©m, se vocÃª Ã© pobre, meu leitor, vocÃª ta ferrado.
NÃ£o ouse roubar uma embalagem de manteiga que vocÃª vai preso. O que vale nÃ£o Ã© a cor e sim a falta de dinheiro pra pagar um advogado.
NÃ£o Ã© a cor que define quem Ã© mais merecedor ou menos merecedor.
O que define isso Ã© o sistema, que estÃ¡ absolutamente errado. Pune preferencialmente os miserÃ¡veis e os pobres, sejam eles de que cores forem.
Com tudo isso, ainda somos um paÃs multirracial.
Brancos se casam com negros, negros se casam com orientais, orientais se casam com Ãndios, e ninguÃ©m discrimina mais ninguÃ©m por causa disso. EvoluÃmos nessa questÃ£o.
O estabelecimento de cotas para negros nas universidades federais estÃ¡ pondo lenha em uma fogueira que atÃ© entÃ£o ninguÃ©m tinha pensado em acender.
Se o preconceito com pobres e negros existe, as cotas criam um preconceito inverso, mas, da mesma forma, privilegiando um em detrimento do outro.
NÃ£o existe nada de totalmente negativo na idÃ©ia de como garantir o direito Ã educaÃ§Ã£o, mas nÃ£o se pode determinar quem vai e quem fica, apenas pela cor da pele.
O Supremo Tribunal Federal tem nas mÃ£os a obrigaÃ§Ã£o de se pronunciar sobre o a questÃ£o das cotas em universidades federais (alÃ©m de outros pepinos como, por exemplo, a questÃ£o da pesquisa com cÃ©lulas-tronco, outra questÃ£o polÃªmica).
Se considerar constitucional o estabelecimento de cotas, podemos considerar que num horizonte curto aparecerÃ£o propostas para o estabelecimento de cotas para negros nas empresas, nos cinemas, nas lojas, nas churrascarias, nos estacionamentos, nos Ã´nibus, nas escolas pÃºblicas...
Entraremos para a histÃ³ria como o paÃs que inventou o â€œapartheid Ã s avessasâ€.
Mas, se considerarem que as cotas para negros se constituem numa inconstitucionalidade, um possÃvel e desagradÃ¡vel desvio serÃ¡ corrigido, criando a oportunidade para que a questÃ£o seja tratada de forma justa, garantindo a promoÃ§Ã£o social em igualdade nÃ£o apenas para negros e brancos, mas para todas as raÃ§as.
O Brasil precisa sair do lugar comum e criar instrumentos para a promoÃ§Ã£o social.
Bolsa-famÃlia pÃµe comida na barriga, mas nÃ£o promove socialmente.
DiscriminaÃ§Ã£o Ã© entregar comida, escola e saÃºde precÃ¡rias para a populaÃ§Ã£o pobre e vender isso â€œmarketeiramenteâ€ como se fosse um grande feito.
Somos um paÃs multirracial.
Vamos corrigir as injustiÃ§as, mas continuando a ser um paÃs multirracial.